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CaF PHOTOS

Um blog com fotos e alguns textos a acompanhar

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Uma pequena reflexão sobre a minha terra

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A Nazaré despoleta, nos que nasceram dela e em todos os que nela vivem e visitam, os mais complexos pensamentos, sensações e atitudes que encontram reflexo nas ondas do mar - no areal, no casario que ainda mantém alguma “tinta branca” e telhados meio tradicionais, e no promontório - símbolos naturais que pertencem à memória colectiva e identidade social desta comunidade.

Contudo, a Nazaré, essa terra, outrora promovida pelo Estado Novo, onde o espaço cénico se encontrava permanentemente montado no areal, já não existe. Assumiu, antes, porém, uma luta desigual e quase insustentável, entre o progresso e a manutenção de um modus vivendi dessa comunidade de pescadores, mas também de agricultores - sempre esquecidos – que viria a desfalecer, dia após dia, mês após mês, ano após ano, até desaparecer.

A Nazaré das sete saias, dos barcos a entrar ao mar e a arribar, entre outras tantas genuínas tradições, acabou.

A construção de um Porto de Abrigo, esse sonho em boa hora transformado em realidade, viria a ter como consequência a transformação de uma identidade social, de uma identidade cultural.

Com ele, os pescadores, e seus familiares, deixariam a tragédia da morte no mar como uma presença “habitual”, em que o luto se fazia de geração em geração, e asseguravam a segurança de voltar a terra, aos braços e abraços dos seus entes queridos.

Mas, relacionando essa obra progressista com a tradição cultural da Nazaré, percebemos que não existiu o cuidado de interligar estas duas realidades, a antiga e a moderna, posto que, após a inauguração dessa estrutura, a Nazaré deixaria de ter os seus barcos à vista dos olhos de todos nós, as redes estendidas na areia ou ao longo do paredão, as mulheres na labuta em terra, e o pescador foi desaparecendo.

Perdia-se assim, uma história, uma vivência, um “não sei quê” de encanto que não mais, até ao presente, se recuperou.

Naturalmente que a Nazaré não se poderia cristalizar nesse cenário quase medieval, todos sabemos disso, antes deveria ter acompanhado a evolução dos tempos, congregando essa cultura ancestral com os desafios da mudança.

O Mar, esse elemento constituído por água salgada, para ser simplista, tem sido a bandeira desfraldada, nos discursos mais recentes. O Mar, esse “lobo”, que tantas vidas roubou a quem dele retirava o “pão”, continua a ser o Mar, nada mais que isso.

As vidas, por sua vez, não voltam, permanecem lembradas por entre voltas de mar e ondas de espuma branca, altaneiras, que desaparecem na areia da praia, que tanto bem fizeram, e fazem, a quem vindo de fora procurava nele o remédio para os males interiores e tanto mal provocou nos que o desafiaram.

Mas se o passado é conhecido e o presente não parece querer recuperar essa Identidade social, o futuro, por sua vez, não se apresenta risonho, a menos que exista uma mudança de paradigma, uma mudança nas prioridades, uma mudança que possa reconciliar o passado com o presente, sem negligenciar a história. A Nazaré necessita de encontrar um equilíbrio entre a preservação das suas raízes culturais e a adaptação às novas realidades sociais e económicas.

A solução talvez resida na promoção de um território onde o turismo não seja visto apenas como uma fonte de receita, mas uma oportunidade para reforçar a identidade local, respeitando as tradições.

O Mar, embora ainda mantenha o seu enorme simbolismo social, deve ser encarado também como uma referência para o desenvolvimento sustentável, onde a pesca e o turismo possam coexistir em perfeita harmonia.

A aposta na preservação ambiental, aliada a um turismo consciente e à valorização do património local, pode ser o caminho para dar à Nazaré um novo fôlego. Mas essa transformação exige, acima de tudo, uma reavaliação das políticas públicas e, mais importante, um compromisso efetivo com a comunidade. Só assim a Nazaré poderá encontrar um futuro que honre o seu passado, sem deixar de se preparar no presente e, por conseguinte, assegurar as possibilidades que os tempos modernos oferecem.

Porém, essa transformação não deve ser imposta, mas sim construída de dentro para fora, com a participação activa dos seus habitantes, pescadores, comerciantes e todos os que nos dias de hoje sentem a Nazaré como sua, numa perspetiva inclusiva, global.

É a comunidade o verdadeiro agente de uma eventual, e difícil, mudança, posto que são os guardiões da memória e da cultura local, aqueles que, com o seu saber fazer e com a sua paixão pela terra e pelo mar, podem garantir que Nazaré não desapareça, mas que se reinvente de maneira a garantir que o futuro seja tão rico e promissor quanto o seu passado.

Um Excelente Ano de 2025 para todos vós.

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