Porque é que eu gosto das Gaivotas
Porque é que eu gosto das Gaivotas.
Nasci e cresci numa terra de gaivotas. Sempre as vi como um elemento identitário da minha terra à beira-mar plantada.
Desses tempos, relembro as mulheres da praia (peixeiras) que atiravam as tripas do peixe que amanhavam ao mar e as gaivotas tinham naquele acto quotidiano o seu alimento.
As gaivotas e as várias espécies de peixe que vinham “à borda” para se alimentar do mesmo, permitindo aos pescadores à cana trazer para casa uns robalos, uns sargos, entre outros peixes que se alimentavam dessas tripas.
Tempos de outros tempos que hoje são completamente desprovidos de realidade, de tanto que a legislação proíbe o mais normal de uma cultura marítima, como é a de Portugal.
Tempos em que não existiam quotas de pesca, nem o pescador lúdico tinha de pagar para pescar!
Gosto das gaivotas porque indicam sempre o quadrante de onde “sopra” o vento.
Gosto das gaivotas porque parecem tão iguais e, em simultâneo, tão diferentes, resultado da grande variedade de espécies, das várias fases de crescimento, normalmente identificadas pela plumagem e coloração do bico, entre outros "sinais" que apenas os mais astutos conhecedores conseguem identificar.
Gosto das gaivotas porque elas transmitem tranquilidade e pura liberdade no seu voo.
Gosto das gaivotas porque elas foram “escorraçadas” do seu habitat natural (no mar e junto ao mar) pela proibição do que se referiu acima.
Assim, num instinto de sobrevivência, tiveram de rumar para zonas afastadas do mar, ocupando zonas urbanas, alimentando-se nos contentores do lixo e vivendo nos telhados. Algo de muito desagradável para todos, como é compreensível. Mas o que podiam as gaivotas fazer? E mesmo assim morrem à fome e são escorraçadas!
São também, e como consequência disso, alvo de abates em massa por iniciativas que não contemplam, na sua análise, que para uma acção existe sempre uma reacção. Não tivéssemos retirado a tradição cultural e as gaivotas ainda hoje preenchiam as nossas zonas litorais.
Gosto, por fim e, porque este texto já vai muito longo, das gaivotas porque foram a inspiração para um livro (1970), uma trilha sonora e um filme (1973).
“Fernão Capelo Gaivota”, uma obra fabulosa e intemporal da autoria de Richard Bach, que depois foi objecto de um filme com uma banda sonora, adivinhem, interpretada por Neil Diamond.
Pois é. Nesse livro o nosso “Fernão Capelo Gaivota”, pode ter esse apelido “Gaivota”, mas é, pelo menos, na minha opinião, a personificação de um qualquer ser humano que se sente desconfortável com a “normalidade” da vida. Será, talvez, um dos livros mais antigos de auto-ajuda, apesar de nunca o ter sentido como tal, mas como uma forma de libertação, a mesma que as gaivotas reais nos transmite no seu voo sereno.
É por tudo isto que eu gosto de ver e ouvir as Gaivotas.
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Foto: cafphotos